Conversas Espirituais  - I

Por  Swami Paratparananda

Transcrita (e traduzida do espanhol) de gravação de reunião no Ramakrishna Vedanta Ashrama em São Paulo em 22/06/86

 [SP26] 

 

 

 

Devoto: Qual a meta da vida humana?

 

Swami:

    Sri Ramakrishna costumava dizer: ‘Conseguir amor por Deus é o objetivo da vida humana. ’ Nem prazeres, nem dinheiro, nem família, nem nada. Porque todas essas coisas que vemos são passageiras, hoje existem, amanhã desaparecem. A única coisa eternamente existente é Deus. Tendo-se amor por Ele pode-se estar em paz, uma paz que não pode ser expressa.

            Que busca o homem? Muitos não sabem o que é a paz. Cada um tem seu conceito de paz. Para alguns é se retirar de toda a agitação da cidade. Quando desfruta desta tranqüilidade diz que é a paz. Mas para as pessoas desta época isto é morte. Onde quer que vão levam um rádio, agora levam também uma TV, senão não podem viver. O homem busca a felicidade, mas cada um tem um conceito de felicidade diferente. Pensa que tendo uma e outra coisa, vai ter felicidade, mas não logra. Vai ter momentânea emoção, mas passando isto vem a reação. Assim quando chega a ter uma coisa, quer mais ou muda de idéia. Ao final vê que nenhuma das coisas que pensava que lhe daria felicidade, lhe deu nada. A felicidade está em Deus e surge primeiro na mente. Uma mente que não está perturbada pelos impulsos e desejos goza de felicidade. Um nome em sânscrito de Deus é ‘Satchidananda’, significa Existência, Consciência e Bem-aventurança Absoluta. Estas não são três coisas distintas, mas uma só que se manifesta em três estados. São três aspectos da mesma coisa. Esta bem-aventurança só tem um modo de atingir: unindo-se com o Absoluto. Como pode ser feito? Negando o mundo. Com isto não quero dizer que todos têm que renunciar ao mundo. Não estão capacitados. Cada um tem que começar de onde está. Um chefe de família cumprindo com seus deveres chega à mesma meta que aquele que medita no bosque. Mas o empenho tem que ser mais forte.

     Na antiga Índia a vida do chefe de família era dura. Ele tinha cinco deveres que cumprir: deveres com os rishis (sábios antigos), deveres com Deus, deveres com sua família e até deveres com os animais. Tinha que estudar as escrituras para cumprir os deveres com os rishis, para satisfazer as divindades deveria fazer os sacrifícios – cultos-, para com a família deveria mantê-los. E os hóspedes que vinham à sua casa deveriam receber sua parte. Não eram considerados como estranhos ou como uma carga; recebiam-lhes como Deus nessa forma. Quando cumpriam todos esses deveres não lhes sobrava nenhum interesse pessoal, os motivos egoístas se esfumavam. Eles viam que toda existência era uma coisa só; Deus em tantas outras formas. Por isso apesar de que Janaka é um dos exemplos, existiram outros. E todos os deveres eram para ensinar a abnegação. Na sociedade atual, como ensinam? Primeiro eu, depois o resto. Por isso existe tanto sofrimento.

 

Devoto: Quem foi Janaka?

 

Swami:

    Era um rei e pai de Sita. Ainda que vivesse como um rei estava desapegado. Em sua corte sempre se discutia temas espirituais. Em uma ocasião, para testar seu desapego, um sábio dissimulou como se seu palácio estivesse incendiando. Vieram mensageiros correndo: “Senhor, seu palácio está queimando.” Ele respondeu: “Mesmo que toda Mithila (seu reino) queime, nada de mim queima”. Estava identificado com o Absoluto. A união com Deus dá esta força, sabe. Des-identificar-se com tudo. Podem imaginar quanta fortaleza e quanta paz se tem quando se chega a esta altura? O preço a pagar não é tão caro. Por isso Sri Krishna disse no Bhagavad Gita: “Chegando ao Qual, nenhum logro parece desejável, e estabelecendo-se no Qual, nenhum sofrimento pode perturbar.”Aí está, se quer lograr isto, tem que se esforçar. Mesmo imaginando, pode-se sentir um pouco de paz. Se chegarmos lá podemos estar tranqüilos, nada deste mundo pode nos perturbar. Hoje estávamos falando sobre ‘jogo’, como enfrentar tudo como um jogo. Se realmente se logra este estado, realmente pode-se ver tudo como um jogo, senão será como todos os jogos de hoje em dia, competição e disputa e se são derrotados, depressão.

 

Comentário de um devoto sobre como a mente busca incansavelmente os objetos dos sentidos.

 

Swami:

    Sabe por que busca? Nós sempre permitimos que a mente buscasse estes objetos e agora queremos frear e no momento não temos condições de frear.

 

Devoto: Há uma solução?

 

Swami:

    Sim, temos que tomar refúgio em Deus. Temos que pedir e dizer a Ele: “Essa é a mente que tenho. Agora como quer que Te adore? Utilize esta mente como queira.” E deixe tudo em Suas mãos e siga adiante. Quero dizer que não há que prestar atenção a mente. A mente reclama, faz suas exigências, mas não há que prestar atenção [nela].  Seguir, rumo à Deus [é o necessário].

 

Um devoto fala sobre a dificuldade em fazê-lo.

 

Swami:

    Que é difícil, todos nós sabemos. Repetindo isto, não fazemos mais fácil, sabe.

 

 Devoto: É possível para todos? Nesta mesma vida?

 

Swami:

    É possível para todos. Nesta vida para os que podem esforçar-se bem. Se não, o que logra, não perde. Isto irá ajudando na próxima [vida] para seguir adiante.

    Qualquer que seja o caminho que siga, é necessário seguir com as práticas que indica este caminho. Por exemplo, no caminho da devoção, cantar hinos, cantos devocionais, quando a mente se cansa de meditar. Repetição do santo Nome de Deus, leitura sagrada, todos estes são os meios para aquele que quer seguir o caminho da devoção.

Para aquele que quer seguir o [caminho do] conhecimento, discernimento entre o Real e o irreal, mas isto não é para todos.

    Quando dizem para as pessoas, ‘Repita o Nome de Deus’, elas perguntam, ‘Isto é tudo?’ Como se fosse uma coisa fácil repetir o Nome de Deus! Se estivermos repetindo o Nome de Deus e a mente está vagando, não ajuda muito. É necessário praticar a repetição do Nome de Deus, mantendo, no início tentando manter, a mente Nele. Uma vez na Argentina, depois de uma conferência, duas senhoras que estavam lá pela primeira vez, estavam conversando entre elas: ‘Sim, isto é bom, mas é para principiantes, nós estamos num estado mais elevado. ’

 

Um devoto pergunta como manter a mente em Deus durante as práticas.

 

Swami:

    Sabe, o que acontece é que dedicamos e nos preocupamos todo o dia com o trabalho. Como é possível que a mente se volte de repente para o pensamento de Deus? Por isso, como dissemos hoje, [é necessário] fazer o trabalho de tal modo que a mente não esteja cheia quando nos sentemos para rezar. Quero dizer, com menos preocupação. Se [durante] todo o dia está pensando no trabalho, não pode pensar uma hora ou meia-hora que pratica exclusivamente em Deus. Por que deu uma importância ao trabalho maior do que o necessário. Por isso quando voltar para casa pode ter um período de descanso, sem pensar no trabalho e depois quando se sentar para rezar, a mente está mais tranqüila.

 

 

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